Sentimento que tem invadido os dias, a alma. Causa desassossego. O sentido de que tenho o que me basta esvai. Revivo as gavetas da memória e encontro alívio. O corpo e a alma se acalmam.
Sinto a mão tocando na minha, a respiração ofegante e a certeza de que poderia chegar lá apenas com este toque. O primeiro toque. Inesquecível.
Abro mais gavetas, procuro pastas, tento significar entretanto as imagens estão puídas. Há quanto foi? Por vezes parece-me ontem, mês passado, um ano talvez. Não sei mais. Perdi-me nesse meio de tempo.
Recordo de uma frase jogada: "gosto de ter histórias para contar, depois".
Ainda sou uma história ou estou trancada numa gaveta a qual jogou fora a chave, pois não era aceitável?
Não recordo com precisão como nos encontramos nessa vida. Tento nas pastas mais puídas encontrar alguma resposta em vão.
Não me importa, tampouco.
Não me basta o que tenho. Como não me bastaria você se porventura não restasse apenas como uma longínqua recordação.
Olho a mesa de trabalho a minha frente e aqui na realidade, na vida palpável, buscava histórias para contar, assim como você.
E sinto falta da construção, da trama, do enredo, dos ensaios varando a madrugada...
Falta de como eu era com você.
Passiva, paciente, obediente.
A personagem que construí para que me encaixasse nas suas histórias.
Sendo franca comigo, a personagem que deixei você construir e então como atriz de quinta, tentava entregar bem meu papel.
Aqui fora, na realidade, rio.
Tudo foi previsível e ridículo.
Só que hoje o saudosismo é mais forte em mim e revivo aquele momento exato do primeiro toque.
O beijo no rosto, as mãos dadas pela rua não eram mais que mera formalidade, que tínhamos que cumprir por tantas horas de ensaio, afinal.
Quando pegou minha mão e a tocou intimamente, com suavidade... Sim, foi o que disse mais tarde: foi como se tivesse me tocado. E ainda agora, nem sabendo precisar quando foi, fecho os olhos e consigo sentir sua mão tocando a minha e meu corpo inteiro se sentindo tocado, acariciado, beijado e sinto pulsar dentro de mim, como foi da primeira vez.
E me questiono porque tanto poder sobre mim? Como conseguiu o poder de me fazer gozar com um toque de mãos?
Na vastidão deste mundo e do universo não é possível que seja assim só com você! Encontrarei na minha vida estabelecida e satisfatória o mesmo desejo, o mesmo prazer.
Serei eu a escritora da minha personagem agora e o poder não será seu sobre mim. O poder é meu.
Engodo, afinal sempre fui eu cedendo à você.